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ANÁLISE

O controle das estratégias musicais não está mais na sala dos executivos

Juliette Freire e seus clipes reverberaram positivamente nas redes sociais: prova da mudança nas estratégias (foto: Reprodução)
Juliette Freire e seus clipes reverberaram positivamente nas redes sociais: prova da mudança nas estratégias (foto: Reprodução)

As diversas gerações de artistas que podemos acompanhar atualmente é, de verdade, um privilégio. Mas, além disso, também é uma demonstração genuína da evolução do mercado musical, suas estratégias e investimentos. Há 50 anos, os artistas estavam mais ligados à suas performances em grandes shows e festivais de música, eternizando alguns de seus momentos nos palcos. Com a disco music dominando as discotecas, as festas se tornaram mais um termômetro para o sucesso das músicas.

Com o passar do tempo, estar na TV era a maior conquista que um artista podia ter, principalmente porque a TV passou a dedicar mais tempo para a música, exibindo shows, entrevistas e gerando mais uma modalidade de tabela musical com os programas que exibiam clipes a partir da votação do público. Mas ainda assim, as rádios ainda eram a fonte de maior desejo dos artistas. Se pudéssemos ver a reação de todos eles ao se ouvirem pela primeira vez no rádio, provavelmente nos emocionaríamos.

Não quer dizer que o rádio se tornou um veículo dispensável ou que os artistas atuais não se preocupam com ele. Mas é óbvio que os caminhos que trouxeram a música até aqui são muito diferentes dos que os artistas lançados há 30, 20 ou 10 anos estavam habituados. Mariah Carey é simplesmente uma das recordistas em vendas de álbuns na história da música e contava com um apoio massivo de veículos como TV e rádio durante os anos 90, estimulando a medição específica do desempenho das músicas no rádio, o que garantiu uma importância do veículo para os charts da Billboard que persiste até hoje.

O tempo foi passando e fomos apresentados a novas formas de consumo, como a venda digital. Esse foi o período mais lucrativo da história para a música, especialmente para as gravadoras. O iTunes, desenvolvido pela Apple, se tornou uma nova referência de sucesso ao listar as músicas mais vendidas em tempo real. Com isso, era possível perceber o reflexo de apresentações, polêmicas e ações nas músicas dos artistas. A venda passou a contar com um processo facilitado, em que era possível comprar a música pelo aparelho de celular ou computador. Não só música, como ringtones dessas mesmas músicas.

O videoclipe já era um produto bem requisitado e com produção cada vez mais sofisticada a essa altura, mas ainda contava com os programas de TV para se popularizar. Aos poucos, o YouTube deixou de ser apenas um site de compartilhamento de vídeos e se tornou mais uma ferramenta de estratégia musical que contribuiu para a popularidade de artistas e músicas. Atualmente, os clipes musicais ainda são essenciais e são cada vez mais aprimorados, mas sem o mesmo alcance bilionário que o YouTube poderia proporcionar.

Toda essa volta é para parar em um ponto. É de conhecimento geral a importância das plataformas de streaming e redes sociais de compartilhamento de vídeos para a propagação em massa das músicas, através das mais diversas estratégias, mesmo as mais forçadas. Mas o ponto é que em algum momento os artistas, suas equipes e gravadoras perderam o controle e não conseguiram acompanhar a mudança das estratégias.

O exemplo de hoje é Katy Perry, que tem uma carreira muito respeitosa, com números invejáveis e produções cinematográficas em seus clipes e turnês. Ela surgiu como cantora no mainstream exatamente no momento em que a venda digital se tornou maior que a venda física, conseguindo estabelecer um recorde que apenas Michael Jackson havia conquistado antes e por anos seu nome parecia imbatível. Ela ainda é um nome muito importante para a música, mas é óbvio que as estratégias fugiram do seu controle.

Isso não tem a ver só com o apelo das músicas, o que ficou claro com o último trend de TikTok que reviveu Harleys in Hawaii, single de Katy lançado há praticamente 2 anos, que agora é ouvida cerca de meio milhão de vezes diariamente após o viral. Apesar de uma recepção calorosa dos fãs e da mídia especializada na época, a música não obteve o mesmo sucesso que músicas bem recepcionadas de Katy alcançaram outrora. Enquanto a equipe de Katy pareceu se preocupar com um bom clipe que servisse para divulgar a marca de motos, a aproximação com as novas formas de consumo musical foi tecnicamente zero.

Lançar músicas curtas, usando chavões atuais, com a produção mais óbvia possível e sem profundidade não é nenhuma garantia de alcançar a atenção dos trends atuais. É preciso se aproximar desses ambientes, entender a maneira que suas tendências se criam e permitir, mais do que organicamente, uma criação colaborativa do produto musical. É assim que diversos artistas atuais se garantem com seus lançamentos, deixando os fãs e simpatizantes de música se sentirem parte do processo. Essa tendência, sim, não tem o menor sinal de que vai passar rápido.

Gabriel Bueno é publicitário de formação, atua no mercado desde 2013 nas áreas de criação, mídia e produção. Viciado em acompanhar música, sempre disposto a comentar premiações, álbuns, videoclipes e tudo que envolve o meio musical. É o autor da coluna Decifrando, publicada no TV Pop semanalmente. Siga o colunista no Twitter: @GabrielGBueno_. Leia aqui o histórico do colunista no site.

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