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ANÁLISE

Globo homenageia Consciência Negra, mas falha no combate ao racismo

Babu Santana é ator da Globo
Babu Santana só ganhou destaque na dramaturgia da Globo após reclamação pública (foto: Victor Pollak/TV Globo)

Chegamos em novembro, marcado pela comemoração do Dia da Consciência Negra, e a TV Globo decidiu fazer uma programação especial durante todo o mês, com filmes protagonizados por negros e uma nova edição do especial Falas Negras. Há quase três anos, a emissora foi duramente criticada pela escalação do elenco de Segundo Sol, que retratou uma Bahia muito mais branca do que realmente é. Mais recentemente, a rede também repercutiu pela constrangedora edição do Em Pauta, em que a GloboNews promoveu um debate sobre racismo sem ter uma pessoa não-branca entre os convidados. O tempo passou e, mesmo celebrando em tela e tentando agora mostrar ter pluralidade, a líder de audiência segue tropeçando e falhando no combate do racismo estrutural.

Uma das falhas mais recentes da emissora foi vista na novela Nos Tempos do Imperador, em cartaz no horário das 18h. A trama foi criticada na internet por uma cena que dava a entender que racismo reverso existe — a autora foi em suas redes sociais para assumir o erro, pedindo desculpas e informando que, na época em que escreveu a cena, não havia uma assessoria especializada no assunto, oferecida apenas em um segundo momento. Também há críticas a personagens com Síndrome do Branco Salvador – em que brancos se tornam destaque e tomam aquela luta para si.

A Síndrome do Branco Salvador também pode ser vista em um dos filmes escalados pela Globo para a comemoração da Consciência Negra. Histórias Cruzadas, transmitido em 7 de novembro na sessão Temperatura Máxima, tem como protagonista Emma Stone. A sua personagem utiliza dos seus privilégios para ajudar as minorias, enquanto as histórias das empregadas servem de pano de fundo. Viola Davis, que interpretou uma das domésticas, até se arrependeu de ter feito o longa. Este ponto de vista tem cada vez menos espaço em Hollywood, dando espaço a histórias dirigidas, produzidas e escritas por pessoas negras, resultando em produções como Infiltrado na Klan e Judas e o Messias Negro.

A escalação de atores para os produtos da dramaturgia também pode ser alvo de críticas. Ao que parece, apenas Taís Araújo está disponível para ser protagonista. Mesmo com grandes atores como Sheron Menezes, David Junior e Lucy Ramos, estes são utilizados apenas em núcleos secundários. Além de nunca serem empresários, sempre empregados. Podem vir dizer que as últimas novelas que foram ao ar na emissora como Amor de Mãe, Salve-se Quem Puder e Totalmente Demais tenha tido um elenco diversificado, mas quantos deles tiveram destaques? Quantos tiveram histórias que não servisse de estepe para um personagem branco? Babu Santana, no folhetim de Daniel Ortiz, foi uma exceção após expor no Big Brother os tipos de personagens que ele interpretava.

Parando para analisar, em Amor de Mãe a protagonista de Taís Araujo perde espaço para Adriana Esteves e Regina Casé, enquanto Jéssica Ellen serve para sofrer diversos acidentes durante a história e servir discursos rasos sobre racismo, dando uma impressão falsa de que a trama é antirracista. Os elencos das próximas novelas que irão ao ar na rede mostram que ela segue com o mesmo padrão de escalações. Em Um Lugar ao Sol, podemos contar nos dedos quantos não-brancos foram escalados — a estreante no horário das nove, Lícia Manzo, pode ser reconhecida por A Vida da Gente, recém-reprisada, que tinha apenas Marcello Melo Jr. e Neuza Borges, ambos empregados. Os quatro protagonistas de Quanto Mais Vida, Melhor são brancos.

É louvável que a Globo tenha tentado mostrar ao decorrer de todo o ano uma inclusão com os especiais Falas, mas segue sendo nítido que a emissora não segue isto à risca em seus bastidores. Em suas produções nacionais, principalmente as de maior lucro e audiência, como as novelas, não há um autor negro, sequer um diretor entre seu portfólio. Enquanto isto, o maior espaço que temos é para personagens escravos, empregados ou traficantes. Procurada pelo TV Pop, a rede não quis se manifestar sobre o conteúdo desta análise.

Mateus Ribeiro é engenheiro por formação, e nas horas vagas se diverte maratonando séries e assistindo programas de origem duvidosa da televisão brasileira. No TV Pop, escreve semanalmente sobre as séries produzidas pela indústria norte-americana. Converse com ele pelo Twitter @omateusribeiro. Leia aqui o histórico do colunista no site.

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