Pesquisar
Pesquisar
Close this search box.
PRÁTICA ILEGAL

Jovem Pan comete crime e usa criança em merchan de tônico milagroso

Paulo Mathias é um dos âncoras da Jovem Pan News
Paulo Mathias protagonizou merchandising ilegal no Morning Show (foto: Reprodução/JP News)

Com dificuldades para conseguir bons anunciantes, a Jovem Pan já dá sinais de que aceita fazer qualquer negócio em seu recém-lançado canal de notícias. Nos últimos dias, os telespectadores de programas como Morning Show e Pânico foram bombardeados com ações de merchandising testemunhal de um tônico capilar que promete não só acabar com a queda dos cabelos, mas acelerar também o processo de crescimento de novos fios. Na terça-feira (9), até mesmo uma criança de sete anos foi utilizada pela JP News para ilustrar os benefícios do produto — o uso de menores de idade em propagandas é vetado pelo CONAR há quase nove anos, assim como o direcionamento de publicidades para o público infantil é visto como ilegal para o Código de Defesa do Consumidor.

O merchandising ocupou seis minutos — uma infinidade para os padrões de publicidade televisiva — do Morning Show de terça. Na ação publicitária, o âncora Paulo Mathias e o comentarista Vinícius Moura interagem com uma merchandete da Ervik, fabricante do tônico capilar, sobre os supostos benefícios do produto. “Eu quero conversar com você, que tem problema de queda capilar, e esse é um problema que afeta tanto os homens, como as mulheres. A galera que nos acompanha viu esse produto como uma grande solução para a queda de cabelo”, disse Mathias, seguido por uma longa introdução feita pela garota propaganda sobre o público alvo do composto químico.

“Você, que está com um problema de queda capilar, que está aí sofrendo, que não sabe mais o que faz, ou que está com aquelas famosas entradas, que os homens sofrem muito com isso, a mulher que tem o cabelo ralinho, prestem atenção. Nós juntamos os melhores princípios ativos em um único produto, que está fazendo o maior sucesso”, anunciou a merchandete, pouco antes de exibir imagens de uma criança identificada apenas como João, de sete anos, supostamente antes e depois de utilizar o Tônico Capilar Hairvik.

“O João, ele tinha alopecia androgenética, e a mãe dele sofria muito, por ele ter apenas sete anos. Ela chamou a gente e falou que queria compartilhar, contar a história dele, porque realmente fez uma diferença no cabelo desse menino, que é emocionante ver essa imagem. A evolução é incrível”, afirmou a representante da marca, enquanto o Morning Show exibia uma montagem com fotos do menor de idade — a reportagem do TV Pop optou por não reproduzir o vídeo da ação de merchandising, disponível nas páginas oficiais do canal de notícias (clique aqui para ver, a partir de 22 minutos e 47 segundos do programa).

As frases da garota propaganda do fármaco da Ervik, no entanto, não passam de chavões de efeito para aumentar as vendas do produto supostamente milagroso. Basta uma rápida pesquisa para revelar que é impossível existir um diagnóstico definitivo de alopecia androgenética, a popular calvície, antes dos 17 anos. “Os primeiros sinais da alopecia androgenética nos homens podem aparecer entre 17 e 23 anos. Dezessete anos é uma idade realmente perigosa. Os cabelos não caem de uma vez, mas a queda é contínua, persistente e irreversível, porque determinada pelos genes que a pessoa herdou do pai ou da mãe”, afirma o doutor Dráuzio Varella, em trecho extraído de sua página oficial na internet.

Além do depoimento controverso, o canal de notícias cometeu uma violação primária do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária. Desde março de 2013, o CONAR veta que crianças menores de 12 anos atuem em ações de merchandising testemunhal — ele também proíbe participações em quaisquer outros tipos de ações publicitárias. O órgão, no entanto, não tem poder para punir veículos que não sigam suas recomendações, atuando apenas como uma espécie de regulador da ética publicitária no país.

No entanto, a publicidade veiculada pela Jovem Pan esbarra em outros aspectos legais. A Constituição Federal, em seu artigo 227, afirma que a manutenção dos direitos das crianças são uma obrigação que deve ser compartilhada entre toda a sociedade, enquanto o Estatuto da Criança e do Adolescente (lei nº 8.069/1990) afirma que a infância precisa ser preservada em qualquer tipo de relação, inclusive em casos comerciais.

O Código de Defesa do Consumidor (lei nº 8.078/1990) é explícito ao dizer que direcionar publicidade para o público infantil é uma prática abusiva e ilegal, independentemente do tipo de serviço. Mais recentemente, o Marco Legal da Primeira Infância (lei nº 13.257/2016) determinou a proteção da criança contra toda forma de violência e pressão consumista, prevendo a adoção de medidas que evitem a exposição precoce de menores de idade à comunicação mercadológica.

Ação de merchandising durante o Morning Show, da Jovem Pan News
Vinícius Moura e Paulo Mathias apresentam o tônico milagroso com uma merchandete da Ervik (foto: Reprodução/JP News)

Emissora se defende

Em nota enviada para a reportagem do TV Pop na noite de terça-feira, a assessoria de imprensa da Jovem Pan News defendeu a ação publicitária veiculada pelo Morning Show. “A veiculação ocorreu em concordância ao Estatuto da Criança e do Adolescente, e sendo o produto regulamentado pela Anvisa”, afirmou o canal de notícias. O posicionamento da empresa, no entanto, não condiz com a realidade. O Tônico Capilar Hairvik nunca foi aprovado pela Anvisa, assim como todos os outros produtos comercializados pela Ervik.

Dentro de sua página oficial, a Anvisa disponibiliza uma ferramenta pública que possibilita a checagem de itens enviados para a apreciação da agência, através do envio do nome do produto ou através do CNPJ da respectiva empresa. Em seu site, a Ervik Comércio de Produtos de Saúde e Beleza Eireli diz operar com o CNPJ 35.420.481/0001-79. Este número, no entanto, nunca fez o envio de produto algum para a avaliação e regulamentação do órgão governamental.

A reportagem também fez insistentes testes pesquisando por Hairvik na plataforma de checagem de nomes comerciais submetidos para a análise da Anvisa. O resultado, porém, sempre foi o mesmo. De acordo com o órgão, “não há registro” de nenhum produto com este nome em nenhuma das categorias monitoradas.

Leia mais