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Ex-repórter do Gugu abre processo milionário contra a Record e expõe TV

Foto do jornalista Rafael Machado, ex-repórter de Gugu Liberato
Rafael Machado pleiteia quase R$ 12 milhões da Record (foto: Reprodução)

Pupilo de Marcelo Rezende e Gugu Liberato, Rafael Machado ingressou com uma ação trabalhista milionária contra a Record. O jornalista de 31 anos quer que a emissora pague uma indenização de quase R$ 12 milhões por uma série de supostas fraudes trabalhistas durante o período em que ele foi contratado pela matriz da empresa, sediada em São Paulo, entre 2015 e 2019. Conhecido do público por suas reportagens no Programa do Gugu (2015-2017), ele alega que desenvolveu síndrome do pânico após ser deslocado para a equipe do Cidade Alerta e do Balanço Geral SP.

A reportagem do TV Pop teve acesso, com exclusividade, aos autos da ação protocolada na Justiça Trabalhista de São Paulo. Ao decorrer de quase duas mil páginas, os advogados do jornalista e da emissora se digladiam há quase três anos, já que o processo está correndo desde outubro de 2019. Em um dos capítulos da ação, a equipe jurídica de Machado diz que ele teria sido vítima de assédio moral de Leandro Cipoloni, diretor de gestão de Jornalismo da Record até aquele ano, quando se transferiu para a CNN Brasil e passou a atuar como vice-presidente do canal de notícias.

“A Record passou a designar o repórter para conteúdos de cunho policial e agressivo, em que o contratado era designado para fazer coberturas em locais ermos e perigosos, em favelas, matagais e, era imposto em pauta por Leandro Cipoloni e editores-chefes que ele ligasse para bandidos. A emissora exigia que ele lidasse pessoalmente com meliantes, assassinos, torturadores, agressores e bandidos, para que tentasse obter confissões dos mesmos sobre os crimes cometidos, expondo-o ao risco e ao perigo”, justificaram os advogados do comunicador.

Em outra parte da ação, a equipe de acusação revela que Rafael Machado teve até suas contas bancárias bloqueadas após um envolvido em uma das reportagens do Cidade Alerta ter processado o jornalista e a emissora por danos morais. “A Record produz matérias que tem objetivo único e exclusivo de Ibope. Rafael, por cumprir ordens da emissora, foi condenado a indenizar um terceiro, já que a emissora furtou-se de sua responsabilidade. O funcionário capaz e qualificado passou a se sentir desvalorizado, inútil e envergonhado”, dizem os advogados do ex-repórter do Gugu.

Foto do repórter Rafael Machado, da Record
Rafael Machado em entrada no Balanço Geral de 26/10/2018, quando passou mal ao vivo (foto: Reprodução/Record)

Demitido após afastamento por síndrome do pânico

Mais a frente, os advogados do jornalista afirmam que a sua situação tornou-se insustentável no canal após sua transferência para o Balanço Geral Manhã, em 2018. Meses depois de ter passado a dar expediente como repórter do telejornal, Machado foi afastado pela primeira vez sob o diagnóstico de crise de ansiedade, depressão e stress, sendo encaminhado para um psiquiatra. Ele foi liberado de suas funções por mais alguns dias, por recomendação do médico especialista, mas acabou sendo reintegrado ao time de profissionais do matinal tão logo sua licença expirou.

Em agosto do mesmo ano, o jornalista foi encaminhado às pressas para o Hospital Moriah (controlado pelo mesmo grupo empresarial da Record) e foi diagnosticado com uma gastrite erosiva. A emissora, no entanto, não autorizou sua transferência para outro programa e determinou que ele continuasse dando expediente nas atrações matinais. Dois meses depois, em outubro, ele voltou a ser afastado de suas funções após dar entrada em um pronto socorro de um hospital particular com o diagnóstico de crise de ansiedade generalizada.

Dois dias depois de voltar ao trabalho, Rafael Machado teve um apagão durante uma entrada ao vivo no centro de São Paulo para o Balanço Geral Manhã. Ele ficou no ar por apenas 26 segundos e teve que ser levado de volta para os estúdios do canal, aonde foi atendido pela Medicina do Trabalho. No processo, os advogados do repórter anexam um receituário médico feito em papel timbrado da emissora, em que o médico receita ao funcionário doses de Buscopan (remédio para dores abdominais) e Esomeprazol (recomendado para tratamento de doenças gástricas).

Após sair do ambulatório da empresa, o jornalista teria sido abordado por uma coordenadora de telejornais da emissora, que teria dito que o funcionário deveria procurar sua cura no Templo de Salomão. O local em questão é a sede principal da Igreja Universal do Reino de Deus, congregação mantida por Edir Macedo, também proprietário do conglomerado midiático composto pelo R7, Record, Record News, Correio do Povo, Rede Família, PlayPlus, dentre outros.

No dia seguinte, em 27 de outubro de 2018, Machado foi colocado em férias forçadas pelos executivos da Record. Depois de seu afastamento, a emissora decidiu que ele deveria ser reintegrado ao time dos telejornais matinais, desconsiderando os apelos feitos pelo médico psiquiatra que acompanhava o jornalista. Em março de 2019, ele acabou sendo afastado e passou a receber seus rendimentos através do auxílio doença previdenciário do Instituto Nacional do Seguro Social, o INSS.

Dois meses antes, em janeiro, o ex-repórter de Gugu Liberato havia sido diagnosticado com um transtorno psiquiátrico de “difícil controle e piora progressiva”. Um laudo assinado pelo psiquiatra Bruno Sakiyama aponta que o jornalista foi diagnosticado com síndrome do pânico, sintomas de ansiedade generalizada e desenvolveu ainda sintomas de transtorno de estresse pós-traumático, “por exposição indireta e recorrente a situações mórbidas e de violência“, com “prejuízos importantes em relação a capacidade laboral, relações interpessoais e atividades de lazer”.

Em abril, após ser encaminhado pelo INSS de volta ao trabalho, a Record determinou que Rafael Machado voltasse mais uma vez a dar expediente no Balanço Geral Manhã. Os advogados dizem que o comunicador se sentiu “desesperado e com taquicardia” ao saber da decisão e que, então, foi encaminhado para uma reunião com uma assistente social e com Thiago Contreira, diretor de projetos especiais e editorial do setor de Jornalismo. Lá, ele pediu para que o funcionário aguardasse alguns dias em casa para que a emissora pudesse escolher em que projeto ele iria trabalhar.

11 dias depois da reunião, no entanto, o repórter acabou sendo demitido pela emissora. Os advogados do jornalista, no entanto, consideram que a sua dispensa foi ilegal, já que seu afastamento foi provocado por uma doença desenvolvida no ambiente de trabalho — o que, teoricamente, lhe garantiria estabilidade de 12 meses válidos do momento em que o auxílio-doença do INSS foi encerrado e o colaborador voltou a ser reintegrado pela empresa. Diante disso, havia ainda uma solicitação para que ele fosse reintegrado ao quadro de funcionários do canal.

Rafael Machado no estúdio do bloco de notícias do programa Gugu
Rafael Machado foi âncora de um bloco de notícias no programa de Gugu Liberato (foto: Divulgação/Record)

Os valores

Ao todo, os advogados de Rafael Machado pleiteiam que a Record seja condenada a fazer um pagamento de R$ 11.497.133,59 (onze milhões, quatrocentos e noventa e sete mil, cento e trinta e três reais e cinquenta e nove centavos). O valor é dividido em R$ 569.237,92 relativos a supostas diferenças do salário acordado e o valor lançado na Carteira de Trabalho, além dos respectivos montantes de aviso prévio, 13º salário, acúmulos de função, férias, FGTS e períodos de DSR — sigla para Descanso Semanal Remunerado.

R$ 1.549.166,64 seriam relativos ao pedido de equiparação salarial do jornalista com a repórter Fabíola Gadelha. De acordo com os advogados do pupilo de Gugu Liberato, ele e a colega tinham funções idênticas na emissora, atuando como repórteres de telejornal, produtores de reportagens especiais e, eventualmente, como apresentadores de quadros e programas jornalísticos. Em seu período na empresa, Machado foi âncora de um bloco noticioso no programa Gugu e comandou edições do Balanço Geral em São Paulo, Porto Alegre e Campinas, além de especiais temáticos.

Também há a exigência de que a Record arque com R$ 191.613,33 referentes aos valores adicionais de viagens para os programas e seja obrigada a fornecer todos os contratos publicitários feitos para o canal de vídeos mantido pelo jornalista em uma rede social, sob a pena de um pagamento estipulado em R$ 464.832,50. O R7, portal de notícias da emissora, era responsável por gerenciar os acordos de publicidade programática dos conteúdos produzidos pelo ex-repórter de Gugu durante a sua passagem pela empresa.

Diversos outros montantes, de menor valor, são pleiteados pela acusação. A maior quantia citada nos autos, que é de R$ 3.261.785,91, seria relacionada ao pagamento de horas extras sonegadas pela emissora ao decorrer de seu vínculo contratual com a companhia. Já a menor, avaliada em R$ 3.341,80, é referente aos reflexos de valores referentes ao salário adicional noturno no período em que o jornalista cumpriu período de aviso prévio.

Record condenada em 1ª instância

De acordo com um perito médico contratado pelos advogados de Rafael Machado, o trauma provocado pela Record foi tamanho ao ponto do jornalista ter abandonado sua vida em São Paulo e ter começado a fazer uso de uma série de medicações controladas. “Ele faz uso de Rivotril e mudou-se para o município de Rio Grande (RS), aonde reside sua família, e passou a morar com seu cachorro em uma das casas de seu pai. Antes disso, havia se mudado para Holambra (SP), por ter gostado da cidade, considerando-o mais pacata e barata”, relatou o profissional.

“Atualmente, ele ainda segue com sintomas de síndrome do pânico, como eventuais palpitações e pesadelos, já que ainda sonha com coisas da Record. Ele acorda de madrugada e não consegue voltar a dormir, seguindo com momentos depressivos. Atualmente, não sabe o que vai fazer profissionalmente, já que não se vê tocando suas atividades direito, por se sentir abalado. Ele enxerga nas redes sociais uma válvula de escape, mas não sente plenitude profissional nisso”, pontua o perito.

Em dezembro de 2021, a juíza Talita Luci Mendes Falcão considerou procedentes diversas das denúncias feitas por Rafael Machado contra a Record. Ela determinou que a emissora arcasse com o pagamento de diferenças salariais, adicional de viagens, acúmulo de funções, horas extras, adicionais noturnos, indenização por não cumprimento de estabilidade, indenização por danos morais devido ao desenvolvimento de doença ocupacional e danos morais por ter sofrido risco como repórter do Balanço Geral Manhã, além da possibilidade do restabelecimento de seu plano de saúde.

Ao todo, a Record foi condenada a pagar R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais) ao ex-funcionário. A emissora, no entanto, optou por recorrer da sentença e pleiteia em 2ª instância que os valores arbitrados sejam reduzidos, com a eliminação dos valores referentes a indenização de danos morais, principalmente em relação ao montante imposto pela suposta obrigação do relacionamento do ex-repórter de Gugu Liberato em se relacionar com criminosos enquanto dava expediente nos telejornais matinais.

Machado, por sua vez, aproveitou o recurso de sua ex-empregadora para tentar reverter pontos não considerados procedentes em 1ª instância. Atualmente, ambas as partes aguardam uma data para a realização de uma nova audiência na Justiça Trabalhista — a movimentação mais recente na ação é datada de 11 de abril de 2022, em que o órgão reconhece que a chance de um acordo entre as partes é remota, já que o jornalista e a emissora não forneceram dados necessários para a realização de uma audiência conciliatória, apesar de terem sido intimados para tal.

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